Mantenho uma relação anal anual com um homem muito simpático. Sempre conversamos antes, ele me pergunta se ando me sentindo bem e se não estou tomando medicamentos.
Depois ele me leva para a cama, onde não deito, mas fico de quatro. Ele então coloca a luva, passa um creme e me penetra com o dedo. Demora menos de um minuto, pois ele tem prática, faz isso com muitos outros, embora nem tantos como deveria ser.
- Se todos fizessem exame de próstata todo ano – diz ele – não teríamos tantas mortes causadas por puro preconceito.
Na sauna, quando conto que acabei de sair do urologista (ou ele acabou de sair de mim), a reação é tipicamente machona:
- Eu, heim? Só se for com médico japonês de dedinho miúdo!
- Eu, nem morto!
Conto que há anos faço todo ano o exame de toque retal, ainda necessário mesmo complementado por exames de sangue que detecta indícios de câncer, além de ultrassonografia do abdome. Tudo isso tem custo, claro, mas bem menos do que custaria um câncer em estágio avançado, sem falar no custo em sofrimento também para a família.
Eles ficam em silêncio. Acrescento com voz macia:
- Meu médico diz que a resistência de muitos homens ao toque retal é por temor homossexual.
- Como assim? – os dois perguntam juntos: explico com voz penetrante:
- Diz ele que muitos têm medo de ser penetrados e... gostar.
Os dois me olham soltando fogo pelos olhos entre os vapores da sauna, e saem sem falar palavra. Fico lembrando das palavras do médico:
- Todo ano, no Brasil, mil homens têm o pênis amputado, simplesmente porque não mantém uma boa higiene genital e desenvolvem câncer no pênis. Nesses casos, a pobreza e a falta de condições sanitárias ainda são as maiores responsáveis. Mas o câncer de próstata mata homens de todas as classes, por puro preconceito machista. Só vão saber que têm câncer quando o tumor cresceu tanto que se torna mortal... Mas o exame não dói nada, dói?
Não só não dói, garanto, como ainda ganho um beijo. De minha mulher, que todo ano pergunta quando chego em casa:
- Foi tudo bem? O que ele disse?
- Que estou ótimo.
Então,ela diz me pegando pela mão e levandopara a cama:
- Vamos comemorar!
Antes, faço minha prece: obrigado, Senhor, por mais um ano!
(Crônica de Domingos Pellegrini, jornal Gazeta do Povo de 8 de agosto de 2010, Caderno G, página 2)
Com esta bela crônica, quero deixar aqui minha homenagem ao meu Pai, pelo dia dos Pais. Por ignorância dele e minha, teve câncer de próstata e foi à única vez que foi a um médico. Mas foi tarde demais...
Depois ele me leva para a cama, onde não deito, mas fico de quatro. Ele então coloca a luva, passa um creme e me penetra com o dedo. Demora menos de um minuto, pois ele tem prática, faz isso com muitos outros, embora nem tantos como deveria ser.
- Se todos fizessem exame de próstata todo ano – diz ele – não teríamos tantas mortes causadas por puro preconceito.
Na sauna, quando conto que acabei de sair do urologista (ou ele acabou de sair de mim), a reação é tipicamente machona:
- Eu, heim? Só se for com médico japonês de dedinho miúdo!
- Eu, nem morto!
Conto que há anos faço todo ano o exame de toque retal, ainda necessário mesmo complementado por exames de sangue que detecta indícios de câncer, além de ultrassonografia do abdome. Tudo isso tem custo, claro, mas bem menos do que custaria um câncer em estágio avançado, sem falar no custo em sofrimento também para a família.
Eles ficam em silêncio. Acrescento com voz macia:
- Meu médico diz que a resistência de muitos homens ao toque retal é por temor homossexual.
- Como assim? – os dois perguntam juntos: explico com voz penetrante:
- Diz ele que muitos têm medo de ser penetrados e... gostar.
Os dois me olham soltando fogo pelos olhos entre os vapores da sauna, e saem sem falar palavra. Fico lembrando das palavras do médico:
- Todo ano, no Brasil, mil homens têm o pênis amputado, simplesmente porque não mantém uma boa higiene genital e desenvolvem câncer no pênis. Nesses casos, a pobreza e a falta de condições sanitárias ainda são as maiores responsáveis. Mas o câncer de próstata mata homens de todas as classes, por puro preconceito machista. Só vão saber que têm câncer quando o tumor cresceu tanto que se torna mortal... Mas o exame não dói nada, dói?
Não só não dói, garanto, como ainda ganho um beijo. De minha mulher, que todo ano pergunta quando chego em casa:
- Foi tudo bem? O que ele disse?
- Que estou ótimo.
Então,ela diz me pegando pela mão e levandopara a cama:
- Vamos comemorar!
Antes, faço minha prece: obrigado, Senhor, por mais um ano!
(Crônica de Domingos Pellegrini, jornal Gazeta do Povo de 8 de agosto de 2010, Caderno G, página 2)
Com esta bela crônica, quero deixar aqui minha homenagem ao meu Pai, pelo dia dos Pais. Por ignorância dele e minha, teve câncer de próstata e foi à única vez que foi a um médico. Mas foi tarde demais...